terça-feira, 31 de março de 2009

Uma escorregada, desculpável, de Jaime Lerner...

O afamado e competente arquiteto do mundo Jaime Lerner esteve nos 316 anos de Curitiba, na Assembléia Legislativa do Paraná, e fez um pronunciamento em nome de todos os ex-prefeitos. Perfeito do começo ao quase fim, vocês poderão ler abaixo, não fosse ele citar o petit pavê como um símbolo de Curitiba, esquecendo-se do fato de que essas pedrinhas irregulares postas no calçamento são verdadeiras armas contra os idosos e contra os que possuem deficiências no ir e vir pela Cidade Sorriso repleta hoje de ar poluído de milhares veículos.

"Olhando Curitiba, vejo muitas cidades. Há uma cidade tradicional. Há uma cidade da inovação. Há muitos sotaques, cada um carregando uma história, cada um representando uma cidade. Há o sofrimento de alguns, que esperam diluí-lo na solidariedade e na oportunidade, que são a síntese de uma cidade, qualquer cidade. Há a realização da maioria, que multiplica as oportunidades e determina a história de uma cidade. E há uma unidade, que faz de todas estas cidades uma única cidade. Uma cidade única, em que todas as gentes – de alguma maneira – se transformam numa só gente. Curitiba é síntese da diversidade porque foi e tem sido a cidade acolhida. Gente de mundos distantes, perseguida por questões religiosas ou pela pobreza. Gente daqui de perto, tolhida por dificuldades crônicas ou embalada por novas buscas. Todos encontraram na nossa Curitiba a vereda da oportunidade. Era natural que os dirigentes escolhidos para conduzir os nossos destinos tivessem, eles também, estilos bem diversos, cada um com suas influências, cada uma com suas convicções, cada um com sua época e sua visão de futuro. Acolhedora, buscou empreendedores do mundo para criarem com os empresários daqui uma base industrial e de serviços que mudou o perfil econômico e multiplicou as ofertas de trabalho e renda. Hoje são 83 as cidades do mundo que estão adotando o BRT, que é o Bus Rapid Transit, que é uma criação nossa de tantos anos. E são centenas as páginas que todos os anos a cidade ocupa na imprensa internacional, como são muitas dezenas de minutos que nossas imagens ocupam nas televisões ao redor do mundo. Tornar-se referência tem a ver também com uma outra coragem. A coragem de iniciar um processo, de não esperar todas as respostas. Sem prejuízo do bom planejamento – e o planejamento é justamente um dos pilares de Curitiba –, é preciso algum compromisso com as possibilidades que surgirão no caminho. Isso porque nem tudo pode ser previsto na dinâmica de nossas cidades, que experimentaram um crescimento veloz nos últimos 40 anos. Muitas das conquistas de Curitiba, hoje consolidadas, começaram como um processo aberto. E esta é a bênção de uma cidade: a capacidade de construir novas e melhores respostas ao longo do processo, sem engessar-se em concepções vencidas. Há ainda o discernimento. Tal diversidade de estilos só enriqueceu a nossa cidade, cada um acrescentando novas perspectivas à moldura do nosso destino. É honroso falar em nome de todos os ex-prefeitos. Mas há o risco da injustiça, pois seria muito factível a traição do esquecimento fazer omitir nomes importantes nestes 316 anos de história. Tampouco seria viável, no espaço de tempo limitado de uma solenidade, deter-se na obra de cada um. Assim, para ser justo com todos, não citarei nomes, mas devo afirmar a contribuição de cada um. Cada um contribuiu. Das obras determinantes até a pequena pedra, o desenho de Curitiba foi moldado gestão a gestão pela vontade de erguer uma cidade que fosse a expressão de sua gente e se projetasse esperançosa para o futuro. De síntese do mundo, Curitiba chegou a referência para o mundo. E isso porque teve a coragem de assumir a simplicidade. Isso é altamente inovador porque a simplicidade é também um processo de síntese. E não é da praxe eleger-se o óbvio. Muitas vezes prefere-se o sofisma, que é o atalho certo para o não fazer, o não resolver. Curitiba elegeu o óbvio. O simples. O evidente.Cidade sem mar, entregou-se ao verde. Cidade sem crescimento acelerado, fez um sistema de transporte integrador, democrático, eficiente em sua simplicidade. Curitiba é uma cidade que sempre soube discernir entre o importante e o fundamental. Uma rua é importante. O sistema viário é fundamental. Uma linha de ônibus é importante. O sistema de transporte é fundamental. Uma praça é importante. Um conjunto de parques capaz de preservar o verde e garantir o lazer da população é fundamental. Uma edificação história é importante. A memória como um todo é fundamental. Em cada época, a Cidade de Curitiba soube equacionar suas demandas presentes e, ao mesmo tempo, abrir o caminho para suas aspirações e necessidades futuras. E se impôs o desafio da inovação. Desafio que todos os prefeitos têm aceito, e do qual a cidade é a grande beneficiária. Porque ao inovar-se, gera a energia para equacionar velhos problemas e alimentar os novos sonhos. E esses são os meus votos. Que a cidade não abandone as suas tradições. Que a cidade não se afaste da inovação. E que não excomungue o petit pavê. O petit pavê é o tapete de nossa história. Merece a preservação e o nosso respeito.” Jaime Lerner

Se dissesse que, uma vez cuidadas as calçadas com petit pavê com competência pelas várias administrações, incluindo aí as diversas dele, o petit pavê poderia não ser excomungado...

4 comentários:

Maurício Alves disse...

Caro Companheiro Surek

Ler e refletir com seus textos é sem dúvida alguma muito agradável e prazeroso. Como você mesmo afirma ao final, se as calçadas de petit pavê de Curitiba fossem bem cuidadas, certamente seriam mais admiradas por todos, mas desniveladas, com buracos e pedras soltas são uma armadilha, além de perderem a beleza.

Uum abraço

Maurício Alves

Miecislau Surek disse...

Pode ser que Jaime Lerner não desceu do carro e não andou pelo seu adorado `pedi prá não te vê´....
Obrigado pelo seu comentário, sempre benvindo.

Miecislau Surek disse...

Recado bem postado pelo companheiro/engenheiro/ouvidor Antonio Borges dos Reis:
Concordo com você companheiro rotaryano e jornalista Surek. Eu também sempre votei no Jaime e acredito que ele desconheça as legislações modernas que amparam as pessoas com deficiências e idosos em nosso país. Você acompanhou minha luta por esta causa quando fui vereador de Curitiba. O mundo inteiro está abolindo este tipo de material nas calçadas, inclusive Paris onde se originou este tipo de uso. Hoje Portugal ainda mantém uma grande quantidade, mas já com muita crítica e ainda considerando que Lisboa tem excelentes calceteiros. Na época que nosso festejado prefeito administrou nossa cidade e criou o calçadão na XV não havia a preocupação que existe hoje com as pessoas com deficiências. Eu conheço inúmeros casos de escorregões no petit pavet em Curitiba que provocaram quebra de braços, pernas, escoriações diversas e infelizmente até a morte de um senhor de 74 anos na Av. João Gualberto a cerca de um quilômetro do escritório do Jaime. Estou copiando este e.mail a ele e a minha amiga Martha Schulmann uma das maiores críticas que conheço em Curitiba ao uso de pedras em calçadas. Quem sabe nós quatro possamos um dia ir até o escritório do Jaime e convidá-lo a andar a pé do seu local de trabalho até a esquina com a trincheira da Rua Comendador Fontana, juntando-se a nós um usuário de cadeiras de rodas. Poderemos até levar uma cadeira extra e todos nós tentarmos usá-la. Eu já fiz esta experiência e recomendo que todo o defensor do petit pavet o faça. Tenho certeza que ele mudará de idéia. O Jaime é uma pessoa com espírito humano como poucos e aberto a novas idéias.
Quem se desloca somente de carro não tem nem idéia como estão péssimos nossos passeios. Você já pensou se por uma questão de patrimônio histórico ainda estivéssemos mantendo as calçadas recém descobertas durante as escavações para a reforma da Praça Tiradentes ? Antes do petit pavet na XV de Novembro tínhamos lá o ladrilho hidraúlico que era um excelente material, plano e antiderrapante como determina a legislação atual.
Fica o convite a todos. Se o Jaime concordar terei o maior prazer em retornar ao seu escritório, tomar um cafezinho e fazermos um test drive nas calçadas do Juvevê.
Abraços a todos
Borges

Só Estrada disse...

Amigo Surek
Bom demais ter vc novamente aí no observatório (e raciocinatório)

Lerner foi um grande arquiteto de Curitiba mas me incluo nos críticos do ptpaVê. O que quero agora é pedir para que lance no seu blog uma campanha de concientização muito necessária: Curitiba já foi essa cidade bem planejada que nos encheu de orgulho. Atualmente ou adaptamos Curitiba ao aumento de população e de circulação ou enfrentaremos breve o desconforto de um sistema superado e esgotado.

Grande abraço

M Tereza