quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Quem criou mesmo o Clic Rural?

Na comemoração do título de cidadão emérito de Curitiba ao amigo e companheiro de jornadas Marcus Aurélio de Castro, mês passado, em Curitiba, eis que tivemos o prazer de reencontrar o engenheiro civil Ary Queiroz, um dos mais competentes e arrojados presidentes da Copel, a empresa em que trabalhei durante vinte e dois anos. Marcus Aurélio pertenceu aos quadros da empresa também, tendo sido um dos brilhantes funcionários da área de relações públicas, formando um grande time de profissionais. Foi ele quem me reconvidou para retornar aos quadros da companhia, me oferecendo o cargo de relações públicas da região de Cascavel, bem na época em que o maior consumidor da Copel era o canteiro de obras da então futura Itaipu, em Foz.

Pois bem. O reencontro de copelianos sempre é uma oportunidade especial, principalmente porque todos praticamente abandonam suas esposas e suas companhias nas conversas, pois o assunto versa sobre a Copel e os bons tempos que ali vivenciamos. Ary Queiroz revelou que tinha sido consultado por um editor de um documento, em forma de livro, em que constava que o programa de eletrificação rural, chamado CLIC RURAL, com tecnologia simplificada e custos razoavelmente baixos para os proprietários rurais, tinha sido idéia de um outro engenheiro, de nome Pugnaloni. Ary e nós damos boas risadas, pois o programa do Clic Rural foi idealizado na gestão de Ney Braga, bem num ano eleitoral, tendo o seu candidato de então, Saul Raiz, um secretário estadual bastante prestigiado, submetido ao Banco Mundial o pedido de financiamento, que foi concedido exatamente naquela época. Com José Richa ganhando a eleição de 1982, como opositor, teve a grandeza de estadista e deu continuidade ao projeto, designou Ary Queiroz como presidente da Copel e determinou que 88 mil proprietários rurais tivessem de imediato acesso aos benefícios da energia rural.

Desencadeou-se na Copel, na verdade, verdadeira guerra interna, porquanto alguns técnicos - xiitas no uso de técnicas extremamente onerosas - colocavam dificuldades para o desencadeamento do programa Clic Rural. Havia recursos disponíveis financiados pelo Banco Mundial, as compras de materiais necessários demoravam para ocorrer, não estavam alocados veículos para os trabalhos na área. Levou-se mais de um ano para que fosse realmente iniciado o trabalho.

Bom informar que nos dois anos que precederam o governo José Richa, cada uma das superintendências regionais tiveram o trabalho de consulta em todas as áreas rurais sobre interesse de agricultores e produtores rurais em participar do programa Clic Rural. Nós, por exemplo, em Cascavel, usamos todo o tipo de lideranças, não interessava a que partido pertenciam, para fazer os levantamentos de proprietários rurais, pedindo inclusive que fizessem de próprio punho um mapa apontando todas as propriedades auscultadas. Foi impressionante a ajuda que tivemos dos vereadores principalmente, dos partidos contrários inclusive ao Governo de então. Tínhamos uma cota de 16 mil pedidos e estávamos com mais de trinta mil cadastros. Para se falar de quem iniciou realmente o programa Clic Rural, posso até direcionar para registro oficial, foram as lideranças locais; elas acreditaram no projeto e fizeram a coisa acontecer.

Num dia de janeiro de 1983, o então superintendente da Copel em Cascavel, engenheiro Maurício Massaud, um dos ícones da empresa na época, adentrou na minha sala de trabalho como relações públicas, sentou na poltrona de visitantes que estava postada diante de minha mesa e perguntou, como sempre fazia aos seus assessores, como iríamos desencadear, na área regional de Cascavel (67 municípios do Oeste e Sudoeste), o programa. Estava preocupado porque em poucos dias haveria uma reunião de treinamento na regional e a superintendência estava sem alocação de pessoal, veículos e dependências, por dificuldades internas superiores. Havia na diretoria e nalgumas superintendências, de materiais principalmente, algumas gestões burocratizantes.

Como estava envolvido no processo de arregimentação de cadastros, pois usei recursos de patrocínios de avisos de desligamentos em rádios e jornais para anunciar o cadastramento de interessados no programa, respondi que o esquema era atender à política da diretoria da Copel e da orientação e da proposta de trabalho do Governo José Richa. Sugeri que a superintendência montasse logo a equipe de trabalho, deslocando alguns veículos de agências e escritórios de distribuição e funcionários que quisessem mudar de setor, já que o universo funcional estava com perfeito acompanhamento pela área de recursos humanos da regional. Quando ele perguntou sobre dificuldades em contar com material suficiente para os pedidos da regional, lembro que lhe informei que achava difícil o presidente Ary Queiroz colocar empecilhos em determinar o atendimento às nossas necessidades.

E o que aconteceu depois disso? O prazo dos contratos iniciais de atendimento aos pedidos assinados era de 60 dias. A equipe formada percorreu os primeiros trechos, reuniu os interessados e pediu que assinassem os contratos. Depois disso, aconteceu que a pressão para as ligações chegou ao conhecimento da diretoria e do Governo, tendo Ary Queiroz comandado com mão firme e visão público-empresarial o atendimento a todas as necessidades. O material destinado a outras regionais, que demoraram um pouco para acompanhar o exemplo de Cascavel no programa, foi deslocado para atender primeiro a quem tinha prazo para entregar as obras. E as entregas de obras foram feitas, com algum atraso, mas que não denegriu a imagem tanto da Copel quanto do Governo do Estado.

Na sequëncia apareceu um grupo de políticos, tendo até um secretário de estado do Governo Richa envolvido no esquema, que achavam que o custo da eletrificação era alto, que estávamos usando postes de concreto que eram mais caros que os postes tratados de eucalipto, muito em uso na área rural do Rio Grande do Sul. Descobriu-se mais tarde que o interesse era mesmo trazer empresas gaúchas de forneciam os postes de madeira e havia indícios de vínculos pessoais no esquema. Claro que a Copel não negava ser um pouco mais caro ligar uma propriedade com postes de concreto; no frigir dos ovos, na verdade, pagar um pouco mais evitava que dez ou quinze anos depois o proprietário, ou a empresa concessionária, tivesse que trocar o poste, com o custo absorvido pelo erário público.

Quem foi ou quem foram os padrinhos do Clic Rural? Posso dizer que foi a Copel como gestora, planejadora e executora do programa, graças a um presidente chamado Ary Queiroz e a um Governo do Estado tendo como Governador um dos últimos estadistas que o Paraná já teve, José Richa. O resto de histórias ou estórias, como a que comentamos no evento, é puro ilusionismo e enganação. A história é uma só, pode ser contada sob diversos ângulos. Um deles, modestamente falando, foi vivido pela gente. E isso nos serve muito para continuar a ver as potencialidades do Paraná como imensas. Basta acreditar sem desvirtuar as coisas...

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